Projeção é de que, com a oferta de isenção fiscal para indústrias e grandes empresas, Santa Catarina deixe de arrecadar cerca de R$ 22 bilhões ao ano
Você sabia que quando a indústria vende garrafas de água para o comércio varejista, e quando este comerciante revende o produto para o consumidor final, essa ação impacta nos investimentos em Educação Pública? O mesmo acontece quando fazemos uma consulta médica, compramos combustível ou andamos de ônibus, dentre tantas outras atividades do nosso dia a dia. Mas afinal, qual é a relação destas mercadorias e serviços com a Educação Pública de Santa Catarina?
O que liga setores que parecem completamente distintos são apenas quatro letrinhas: ICMS. Para quem não conhece muito bem, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é arrecadado pelos estados toda vez que acontece uma operação de compra ou venda de qualquer produto ou serviço.
Do total arrecadado pelo estado, em que o ICMS é responsável pela maior fatia, constitucionalmente, o mínimo de 25% é obrigatoriamente destinado para a Educação. E é aí que o bicho pega. As renúncias fiscais que, teoricamente são concedidas pelos estados para que indústrias e grandes empresas se instalem em seus territórios e, em contrapartida, gerem empregos e desenvolvimento, resultam na redução da arrecadação dos impostos. Consequentemente, também reduzem os valores destinados para a Educação e outras áreas, como saúde, assistência social, segurança e infraestrutura.
Em 2023, a projeção é de que Santa Catarina deixará de arrecadar cerca de R$ 22 bilhões pela concessão de renúncia fiscal para indústrias e grandes empresas. Isso quer dizer que, cerca de R$ 5 bilhões que poderiam ser investidos em Educação, sequer chegarão a existir.
Para ter uma ideia do tamanho do impacto, o orçamento previsto para a Educação de SC pela Lei de Diretrizes Orçamentárias deste ano, é de em torno de R$ 7 bilhões.
O coordenador estadual do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Santa Catarina (Sinte/SC), Evandro Acaddrolli, destaca que a renúncia fiscal traz benefícios para alguns setores, mas provoca grandes impactos negativos em outros.
“O argumento usado para a renúncia fiscal é de que a isso seria um incentivo para geração de empregos. Mas a gente não vê o setor produtivo, especialmente as empresas que receberam tais incentivos, apresentarem números que comprovem a quantidade de novos empregos gerados, ou pelo menos um balanço a respeito de quantos seriam os desempregados caso não tivesse essa renúncia. Não existe um controle da sociedade em relação a isso e, ao mesmo tempo, SC perde a oportunidade de oferecer políticas públicas de qualidade, não apenas na educação, mas também na saúde, segurança e infraestrutura, por exemplo”, exemplifica.
ICMS também impacta no FUNDEB
O economista do Dieese, Maurício Mulinari, explica que, nos últimos 10 anos, o ICMS representou quase 80% da arrecadação de Santa Catarina, o que demonstra a importância da arrecadação deste imposto.
Mulinari destaca que, além da destinação obrigatória de 25% da arrecadação para investimentos em Educação, o ICMS também compõe uma parcela significativa do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).
“O ICMS é uma base fundamental pra que os agentes públicos possam pensar o financiamento da Educação estadual. As renúncias fiscais se intensificaram a partir de 2003 em Santa Catarina, sob o pretexto de gerar mais empregos, mas na prática, não vemos o real impacto disso”, completa.
Para Evandro o reflexo da isenção é sentido na péssima infraestrutura das escolas públicas e na falta de valorização dos trabalhadores da educação. “Santa Catarina está sem uma política de valorização salarial que incentive a permanência de professores na rede estadual e, além disso, a categoria do magistério amarga mais de 10 anos com o mesmo valor do vale-alimentação defasado para os dias atuais”, ressalta o coordenador.