Manifesto e conclamação ao compromisso …

Manifesto e conclamação ao compromisso com a Educação Pública Estadual de Santa Catarina e a Valorização dos Profissionais da Educação

Na V Conferência Estadual da Educação do SINTE-SC, ocorrida no dia 05 de abril de 2025, em Florianópolis, capital do Estado de Santa Catarina, sob o tema “Estamos aqui pela valorização da educação pública”, evento pautado pelo debate sobre a Privatização da Educação pública; o PNE – Plano Nacional de Educação; a plataformização e avaliação da educação; e a matriz curricular do ensino médio de Santa Catarina.

A conferência congregou delegados/as participantes da base do SINTE-SC, representantes dos/as trabalhadores/as em educação da rede pública estadual de Santa Catarina. O SINTE-SC, com 64 anos de luta em defesa da educação pública, gratuita, de qualidade e universal, congrega cerca de 30 mil trabalhadores/as em educação filiados/as e representa em torno de 75 mil trabalhadores/as em educação, sendo 45 mil ativos – aproximadamente 20 mil efetivos e 25 mil ACTs – e 30 mil aposentados/as e pensionistas.

Dessa forma, os delegados/as desta conferência aprovaram esta Carta de Florianópolis, que traz expressa a profunda preocupação e urgência em relação à situação da educação no Brasil e em Santa Catarina, bem como pautas que precisam ser assumidas por todos/as que defendem uma educação pública como direito universal.

O momento exige uma reflexão profunda e ações concretas. É imperativo que a educação pública, gratuita, laica, democrática, inclusiva, de boa qualidade e socialmente referenciada seja colocada no centro das prioridades do país e do estado de Santa Catarina.

A educação desempenha um papel fundamental no desenvolvimento humano, o que engloba o desenvolvimento econômico, social, cultural e socioambiental desse estado e do país. Ela é a base sobre a qual deve ser construída uma sociedade justa, igualitária e sustentável. Sendo assim, a educação de qualidade não pode ser alcançada sem investimento nas condições de trabalho e na valorização dos/as trabalhadores/as da educação, esses que são os responsáveis pela garantia desse direito constitucional na prática.

Segundo o IBGE, o Brasil possui em torno de 11,4 milhões de adultos analfabetos/as. Em Santa Catarina esse numero chega a 165 mil pessoas. Esses números não apenas refletem um déficit significativo no acesso à educação, mas também indicam um alarmante rebaixamento na qualidade do ensino proporcionado por diversos problemas de infraestrutura nas unidades escolares e falta de investimento na formação e qualificação dos/as trabalhadores/as em educação. Mesmo depois de passados quatro anos da pandemia de Covid-19, ainda sentimos as consequências e os reflexos das desigualdades educacionais em nosso território. Portanto, ressaltamos a necessidade urgente de uma nova atuação do governo estadual, que possa garantir o direito à educação de qualidade para todas as pessoas.

Atualmente, a educação tem sido envolvida pelo processo de financeirização da economia, com a concentração da riqueza e a oligopolização do capital no ramo educacional. Com a financeirização, desenvolve-se uma dinâmica especulativa em escala mundial, que transforma a educação em um ativo financeiro subordinado aos interesses dos investidores. Isso pressiona pela intensificação dos processos de privatização e pelo aprofundamento dos critérios de gestão empresarial da educação, com sérios prejuízos à educação pública.

A reforma que criou o Novo Ensino Médio (NEM) reforça esses critérios de caráter empresarial, prejudicando professores/as e estudantes e ampliando a segregação socioeducacional. Dentro desse quadro entram os processos de plataformização, que utilizam de tecnologia privada para intensificar a exploração sobre os professores/as.

Estamos aqui pela valorização da educação pública em Santa Catarina. É fundamental destacar o grave problema da contratação temporária dos professores no nosso estado. Enquanto o governador publicamente prometeu 10 mil novas vagas preenchidas por meio do concurso público, apenas 3 mil trabalhadores/as foram chamados no início de 2025. Dessa forma, o concurso foi insuficiente para preencher todas as vagas excedentes da rede pública estadual, sendo que 63% das vagas exclusivamente docentes permanecem sendo ocupadas por ACTs. Logo, o estado permanece muito longe de atingir a meta do Plano Nacional de Educação, que prevê que no máximo 10% dos docentes sejam temporários.

Em várias regiões do estado muitas escolas registram falta de trabalhadores/as em educação. Tanto no apoio pedagógico, realizado por AEs (assistentes em educação), ATPs (assistentes técnico-pedagógicos) e Especialistas, quanto dentro da sala de aula, onde faltam principalmente os segundos professores de inclusão, há carência de preenchimento de vagas, algo que afeta a qualidade da educação.

A falta dos segundos professores, em particular, compromete a inclusão de todos os grupos sociais, resultando em disfunções no sistema educacional e ampliando as desigualdades existentes, impactando diretamente na qualidade do ensino e no desenvolvimento dos/as estudantes.

Os desafios postos aos/às profissionais da educação da rede pública estadual aumentaram com a atuação de diversos governos estaduais de ideologia neoliberal, que vêm ao longo dos anos destruindo o serviço público estadual. Sistematicamente promoveram uma política de arrocho dos investimentos nas áreas públicas e repasses de volumes bilionários de recursos para as políticas de privatização. Na questão da seguridade social, promoveram um desmonte do sistema previdenciário, com ataques principalmente aos aposentados/as com o desconto de 14%. Em relação às carreiras do serviço público, realizaram um achatamento e desestruturação dos planos de carreira.

Assim, para que possamos alcançar uma educação de qualidade que verdadeiramente promova o desenvolvimento do Brasil e de Santa Catarina, é necessário que o governo estadual tome medidas concretas e eficazes em várias frentes:

Valorização dos/as trabalhadores/as da educação

Os/as professores/as e os/as demais profissionais que atuam nas unidades escolares são primordiais para a construção de um sistema educacional estadual que atenda as necessidades de cada comunidade catarinense. Contudo, as condições de trabalho desses/as trabalhadores/as são precárias, e sua remuneração é incompatível com a importância do papel que desempenham.

É urgente promover políticas que garantam salários dignos e condições de trabalho adequadas. A valorização dos/as trabalhadores/as da educação não apenas melhora a qualidade do ensino, mas também contribui para a retenção e atração de mais profissionais para a carreira docente. Dados demonstram que o magistério catarinense tem uma das piores carreiras do Brasil, algo que promove o desestímulo à qualificação permanente dos/as trabalhadores/as em educação.

Apesar dos discursos pomposos e eleitoreiros do atual governador sobre a aplicação de 100% dos recursos do FUNDEB na valorização dos/as trabalhadores/as da educação da rede estadual, nenhuma proposta concreta foi apresentada e nem o reajuste reivindicado pelo magistério de 23% até agora avançou.

Investimento em infraestrutura educacional

A infraestrutura das escolas e instituições de ensino deve ser adequada e segura para proporcionar um ambiente de aprendizado que favoreça o desenvolvimento dos/as estudantes. Isso inclui não apenas a construção e manutenção das estruturas físicas das escolas, mas também a disponibilidade de recursos e o investimento na formação e qualificação pedagógica e tecnológica. O governo tem subalternizado o investimento na estrutura escolar, sendo que cortou 14% dos investimentos com obras e instalações nas escolas em 2024. Esse descaso foi decisivo para o caos no início do ano letivo de 2025, quando as salas de aula registraram temperaturas superiores a 40ºC por conta da ausência de uma estrutura eficiente de climatização.

Políticas educacionais inclusivas e gestão democrática

Para garantir que todos os grupos sociais, incluindo minorias e populações vulneráveis, tenham acesso a uma educação de qualidade, o governo do estado deve apoiar iniciativas que promovam a inclusão e a igualdade no sistema educacional. É necessária a instituição de mecanismos colegiados e democráticos de natureza estatal para a gestão da escola e dos sistemas de ensino. Também se faz premente o cumprimento do previsto no Art. 14 da LDB, de modo que a transparência e o controle social possam ser efetivamente praticados.

Com práticas educacionais inclusivas é possível melhorar significativamente os resultados acadêmicos e o bem-estar dos/as estudantes. Dentre essas práticas se destacam as políticas de gestão escolar democrática, com eleição direta para a gestão escolar, totalmente o inverso da forma como o estado atualmente realiza as eleições dos planos de gestão escolar. Criaram-se critérios de barreira, como a exigência de quórum mínimo por segmento (pais, estudantes e servidores), na intenção de impedir o acesso de gestores comprometidos com a educação, algo que fere o princípio da gestão democrática. Esse modelo implementado atinge o resultado esperado pelo governo, que acaba indicando gestores a partir de sua preferência partidária.  O efeito disso é a falta de diálogo com os segmentos escolares e os demais atores que compõem o ambiente escolar, promovendo inúmeros conflitos internos, perseguições, assédios, burocratização da gestão, etc.

Educação ambiental crítica

Em um momento em que os desafios socioambientais são cada vez mais prementes, é essencial que a educação também enfoque na formação de cidadãos/ãs conscientes e preparados/as para enfrentar essas problemáticas. A educação ambiental crítica deve ser integrada ao currículo educacional para preparar as novas gerações para um futuro mais sustentável, justo e igualitário

Tecnologias educacionais centradas nas pessoas

Em um mundo cada vez mais digital, os/as trabalhadores/as da educação precisam se apropriar dos recursos tecnológicos disponíveis, a partir de perspectivas de integração dos métodos e práticas de ensino e aprendizagem às tecnologias de informação e Inteligência Artificial (IA), como subsídio para a prática pedagógica. Essa apropriação das tecnologias precisa ser crítica, política e material, algo distinto de uma simples integração passiva às novas tecnologias.

O fomento à formação para o uso dessas ferramentas deve indicar um caminho de autonomia dos/as profissionais da educação no seu uso, e nunca de substituição de professores/as.  Além disso, é fundamental garantir e assegurar que os recursos públicos do estado sejam destinados ao fortalecimento das estruturas físicas e pedagógicas da escola pública e não ser transferidos para instituições privadas.

Por fim, enfatizamos que recursos públicos devem se destinar exclusivamente às escolas públicas!

A educação é um direito fundamental e um bem público que deve ser protegido e promovido. Por isso, ressaltamos a necessidade do estado diminuir o volume de suas renúncias fiscais – atualmente em mais de R$ 22 bilhões ao ano – e rever o programa Universidade Gratuita, que visa exclusivamente destinar recursos públicos abundantes para as universidades ditas comunitárias e particulares do estado – R$ 1,5 bilhão em 2025 segundo a Lei Orçamentária Anual. Destacamos a necessidade de regulamentação do setor privado de educação, assegurando que parâmetros democráticos, inclusivos, e de boa qualidade sejam garantidos aos/às estudantes, assim como valorização, garantia a autonomia do/a professor/a e condições dignas de trabalho aos/às trabalhadores/as do setor.

A implementação dessas recomendações é primordial para garantir que todos/as os/as catarinenses tenham a oportunidade de alcançar seu pleno potencial e contribuir para o desenvolvimento de sua comunidade, do seu estado e país. Por isso, DEFENDEMOS que alguns pontos sejam implementados imediatamente:

  1. Valorização dos/as profissionais da educação, por meio da garantia de condições dignas de trabalho;
  2. Implementação imediata do reajuste salarial de 23% para todos/as trabalhadores/as em educação da rede pública estadual;
  3. Investimento imediato de 100% dos recursos do FUNDEB na descompactação da carreira dos/as trabalhadores/as em educação da rede pública estadual;
  4. Interrupção da transferência de recursos públicos para instituições privadas e comunitárias;
  5. Realização de novos concursos públicos para diminuir o percentual de trabalhadores temporários na rede estadual;
  6. Mudança da Lei 16.861/2015 (lei dos ACTs), com a aprovação do PLC 267/2024;
  7. Mudança da Lei 668/2015 (Plano de Carreira), com aprovação do PLC 004/2024;
  8. Aprovação do PLIP – Projeto de lei de iniciativa popular, que visa retirar o desconto dos 14% da previdência dos servidores estaduais aposentados;
  9. Exigência de ensino médio com carga horária totalmente presencial;
  10. Melhoria da estrutura física e didática, incluindo as Tecnologias Educacionais, com vistas a garantir melhores condições de trabalho e aprendizagem nas escolas;
  11. Uso de Tecnologias Educacionais centradas nas pessoas e prioritariamente públicas, com controle social da comunidade escolar;
  12. Educação inclusiva e gestão democrática da escola pública;
  13. Participação dos/as trabalhadores/as em educação da rede pública estadual nas discussões e elaboração do Plano Estadual de Educação (PEE), com incentivo e financiamento do Estado;
  14. Educação Ambiental crítica (incluindo a Educação Climática) na Educação Básica;
  15. Fim do processo de implantação de escolas cívico-militares no estado de Santa Catarina;
  16. Contrariedade ao processo de municipalização das escolas da rede estadual;
  17. Estabelecimento de diálogo permanente com trabalhadores/as da educação, estudantes e movimentos sociais para a construção de currículos escolares que representem os interesses da juventude da classe trabalhadora catarinense;
  18. Articulação entre as universidades, os sindicatos e as entidades representativas, como forma de organizar o debate e a construção de outro modelo educacional.

Conclamamos para que todas as instituições do estado, movimentos sociais e organizações da sociedade civil organizada tomem uma posição firme e proativa em relação ao direito à educação dos catarinenses, comprometendo-se com a melhoria das condições educacionais e a valorização dos/as trabalhadores/as da educação. A educação é um elemento fundamental para a construção de uma sociedade mais justa, e somente com um compromisso coletivo e ações concretas será possível garantir que esse direito humano fundamental para cada brasileiro e catarinense.

Agradecemos a atenção e a consideração dispensadas a este importante assunto contido nesta Carta de Florianópolis.

Estamos à disposição para colaborar e dialogar sobre maneiras concretas de avançar nesse compromisso com a educação.

Atenciosamente, Florianópolis – SC, 05 de abril de 2025.

Subscrevem esta carta os/as delegados/as participantes da V Conferência de Educação do SINTE – SC.

Rolar para cima